Pe. Gregório – Artigo publicado no Em Tempo – 29.09.2019

Faleceu o Pe. Gregório Lutz, grande estudioso da liturgia católica, o que me fez pensar, conhecendo o personagem que a liturgia celeste não mais seria a mesma. De agora em diante será espontânea mas bem preparada com cânticos que evidenciem o mistério celebrado. Cada um fará o que lhe compete e só o que lhe compete, as roupas serão sóbrias. Os leitores prepararão as leituras com bastante antecedência. Na celebração, cada um ocupará o seu lugar segundo as rubricas e terão postura orante. Durante seu longo ministério sacerdotal, o sacerdote que estava chegando no paraíso tinha se esforçado para celebrar bem e levar os participantes das liturgias a fazer o mesmo. Elaborou um roteiro para iniciar o povo das comunidades na reforma litúrgica. O primeiro tema era: “A liturgia é uma festa”. Ele foi um erudito, mas não fazia os outros sentirem o peso da sua erudição. Sóbrio nas palavras, convencia com a perseverança e com o exemplo. Convivi sete anos com ele. Aprendi liturgia por osmose, porque foi meu formador na filosofia e teologia.

Morreu em sua terra natal, a Alemanha. Havia feito do Brasil sua terra de adoção. Foi assessor de liturgia da CNBB, professor em vários Institutos de Teologia e Liturgia, colaborador em periódicos, deixou um legado para a liturgia e para os liturgistas. Não foi um homem de gabinete. Nos finais de semana e muitas vezes durante a semana, ele se desdobrava para servir pastoralmente as comunidades da periferia. Edificou comunidades e templos, lá onde ninguém queria ir. Seu compromisso com os pobres o levou a cuidar materialmente de inúmeras famílias, sem a preocupação de ser politicamente correto. Fiel às amizades, sabia ajudar sem humilhar.

Incansável, usava cada minuto da sua vida para trabalhar. E isto foi o valor maior que ele me deixou enquanto seu formando. Não existem tarefas mais ou menos importantes, tudo é preciso ser bem feito, sobretudo as atividades pastorais. Acompanhou um sem número de construções de capelas e centros pastorais, mas gostava mesmo era de ser padre, fazer as coisas de padre e gastar muito tempo com o ensino da liturgia para as comunidades mais carentes. Era um homem de grande liberdade interior. Entendi com o tempo como ele me permitiu crescer livremente como pessoa e como ele sempre respeitou as minhas opções de vida.

Como éramos livres no tempo de nossa formação. Ao encontrar seus dirigidos em teses de mestrado e doutorado escuto a mesma coisa. Se você desse as razões para uma saída, uma atividade extra tinha o seu aval. Formou pessoas conscientes do seu valor e da sua dignidade, mas responsáveis por aquilo que fazem. Terminou a vida trabalhando. Um confrade disse que ele não teve tempo nem para morrer. Encontrei-o pela última vez na celebração dos meus quarenta anos de padre, em Vila Mangalot. Ele vinha de uma missa numa das comunidades da Anhanguera que ele havia fundado. Não conversamos muito, por que ele devia ir levar em casa alguém que o acompanhava, mas sabia que estava diante do homem que foi para mim um exemplo de sacerdote que me fez ser muito do que sou hoje, e acredito ter visto uma pontinha de satisfação do mestre que conhece o discípulo.

 

ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS

JORNAL: EM TEMPO

Data de Publicação: 29.9.2019

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