Do caos à vida – Artigo Cardeal

“A crise atual não é apenas uma oportunidade para verificar o esgotamento dos sistemas e modelos econômicos, mas também nos encoraja a superar soluções preconceituosas como as que alimentam os esquemas de polarização ideológica, emocional, política, de gênero e exclusão cultural. Em todo o caso, não nos assustemos com o “caos”, porque é precisamente a partir daí que Deus faz as suas obras mais belas e criativas.” (Papa Francisco, Discurso, Organização de Universidades Católicas da América Latina e Caribe)

Vivemos numa espécie de caos, pois nos damos conta da pobreza, da desigualdade, da violência, da fome, da morte. A chaga da guerra com os deslocamentos, as fugas da morte. A polarização ideológica que fecha a porta da escuta e do respeito. O crescer da indiferença a perambular entre nós. O caos se torna mais palpável na indiferença. A vida, às vezes, parece não mais valer, ter pedido a sua valia. Comunidades agredidas, casas destruídas, corpos vilipendiados. As mortes no rio Abacaxis continuam a clamar aos céus. O caos ainda se faz presente na vida daquelas comunidades.

Vamos percebendo que o caos tem gerado vida. No caos da pandemia, quanta solidariedade! Do caos da fome do desemprego: a caridade! Quanta presença benfazeja na relação com os irmãos e irmãs que vivem nas ruas de nossa cidade. Quanto amor e gratuidade em relação às crianças desamparadas. O indiciamento em relação às mortes no rio Abacaxis é sinal de vida e esperança. A verdade deve prevalecer para que a vida possa se manifestar na liberdade. Nos desastres ambientais é admirável a ajuda fraterna, o acolhimento. Nesses momentos somos atingidos mais profundamente em nossa humanidade por que não, no nosso ser cristão. E vai nascendo o desejo de derramar azeite e vinho em nossa humanidade caída e ferida. O caos nos desperta para curar as feridas e restaurar a inteligência mutilada.

O caos é a possibilidade de vislumbrar o ensinamento de Jesus: “A verdade vos tornará livres” (Jo 8,32). Ele oferece o caminho de saída, pois o verdadeiro é que liberta, que liberta dos vícios, do seu isolamento, da ganância, da dominação, da autossuficiência. A chave para ter acesso à verdade é um conhecimento do amor relacional, humilde e aberto, concreto e comunitário, corajoso e construtivo. Tudo o que destrói leva ao caos. O que leva à vida é o cuidado, a justiça.

Cardeal Leonardo Steiner
Arcebispo de Manaus

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