Compaixão, compadecer-se, ter compaixão, se compadecer de alguém. Com-paixão: com estar junto de, ser lançado para a proximidade de, estar na companhia de alguém; paixão, patior, o padecer uma ação, ser tocado pela dor, pelo sofrer; ser atingido pelo outro no seu sofrer (Etimologia e origem das palavras). A pessoa que sente compassio, compaixão, é atingida pela necessidade da pessoa que sofre e, por isso, é atraída para a proximidade. No evangelho de Lucas lemos: “Um samaritano que estava viajando, chegou perto de ele e, ao vê-lo, moveu-se de compaixão. Aproximou-se dele tratou-lhe as feridas, derramando nelas azeite e vinho.” (Lc 10,33-34) O samaritano é atingido pela dor, pela necessidade, pela “semidormência” da morte do assaltado. Atingido, é movido pela aproximação; é patior, padece, a dor e, por isso, tornou-se compadecido.
Ao indicar a compaixão de Deus, Papa Francisco diz: “O Deus feito homem deixa-se comover pela miséria humana, pela nossa necessidade, pelo nosso sofrimento. O verbo grego que traduz essa compaixão (…) indica as vísceras do útero materno (…). É um amor visceral (…). Jesus não olha para a realidade exterior sem se deixar tocar, como se tirasse uma fotografia: ele se deixa envolver. É dessa compaixão que precisamos hoje, para vencer a globalização da indiferença. É desse olhar que precisamos quando nos encontramos diante de um pobre, um marginalizado, um pecador.” (Francisco – O Nome de Deus é Misericórdia).
Neste sentido a compaixão “transcende o egoísmo e o egocentrismo e não tem o coração centrado em si mesmo, mas centrado nos outros, em especial nos pobres e nos afligidos por todo o tipo de misérias. Transcender-se a si mesmo até aos outros, esquecendo-se assim de sua pessoa, não é debilidade, mas fortaleza. Nisso consiste a verdadeira liberdade. Essa autotranscedência é, por isso, muito mais do que enamoramento de si mesmo na entrega ao próprio eu: pelo contrário, trata-se da livre autodeterminação e, por conseguinte, de autorrealização. É tão livre que pode ser livre inclusive em relação a si mesmo, pode superar-se, esquecer-se de si e ultrapassar, por assim dizer, os seus próprios limites.” (Kasper. W., A misericórdia).
São João nos diz: “ao desembarcar, Jesus viu uma numerosa multidão e teve compaixão, porque eram como ovelhas sem pastor”. Viu! O olhar de Jesus que não se fecha diante da multidão sofrida. Olha e se comove. As pessoas não incomodam a Jesus. Ele percebe a procura, a desilusão no rosto daquelas mulheres e daqueles homens. Percebe o abandono no qual vivem. Ele capta o sofrimento, a solidão, a confusão que experimentam. Viu, especialmente, a necessidade mais profunda daquelas pessoas: “eram como ovelha sem pastor”. Homens e mulheres, sem destino, sem cuidado, sem orientação. Vivem sem que ninguém delas cuide. Foi tomado de compaixão, teve compaixão, tornou-se compadecido. Os necessitados, os fragilizados, dos desencaminhados, os tomados de maus espíritos, ali estavam, e ele, vendo-os a todos, é tomado de compaixão e cuidou.
Compaixão oferece, insinua liberdade e gratidão, porque cuidado. Cuidado como gratuidade! Em sendo tocado, em sendo atingido pela compaixão, isto é, pela necessidade e pela fragilidade do outro, sai ao encontro, se inclina, reverencia. Desperta para necessidades mais profundas e começa a servir, a oferecer, como serviço quase cândido, meio silencioso, pois serve como servo, não como senhor. Jesus compadecido a tomar sobre si as dores, os sofreres, as misérias, a pobreza, no ensinar, no aliviar, no curar, no cuidar. Carrega com cada necessitado o peso dos pecados, as dores do corpo e da alma. Como que sofre as dores e se alegra com as alegrias. Alguma troca? Tudo na gratuidade.
Como é extraordinária a compaixão! A graça da compaixão, do compadecimento! Deixar-se atingir pela compaixão. Não se vive melhor fugindo dos outros, escondendo-se, negando-se a partilhar, fechando-se na comodidade. A compaixão concede vida, transforma o viver. A compaixão é vida, graça que liberta, bem que aquece, proximidade que redime!
Leonardo Ulrich Steiner
Arcebispo de Manaus