Parece vivermos tempos relativamente tranquilos, apesar da pandemia, das águas altas e das necessidades básicas que começam a faltar em muitas famílias. Tem-se a impressão de que essa realidade importa quando manchete e notícia; quando espetáculo!
A morte virou espetáculo. Fomos atingidos pelo fato, o episódio que despertou repulsa e revolta. A caça como se caça um animal perigoso; a morte como solução.
Um sinal e sintoma de que a nossa sociedade adoeceu. Colocar a morte de uma pessoa como uma espécie de gozo da barbárie: aplaudir, comemorar a morte de um ser humano, de pessoa, de um filho de Deus. Sentiu-se o cheio da naturalização da vingança e da violência. Os aplausos e a comemoração pela morte demonstram o estado de espírito em que vivemos. A espetacularização do assassinato de um homem acusado de assassinatos. Banalização da morte.
Em lençol carregado
Na ambulância morto lançado
Como troféu de caça.
Na rua comemoração
Da morte banalização
Silêncio… reparação!
Parecíamos ver o poema de Manoel Bandeira: “Bicho”
“O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.”
Os mortos são chorados, lamentados. É estarrecedor que não haja choro por Lázaro no espetáculo da morte. Pelo menos chorássemos a sua loucura, a sua demência; pelo menos chorássemos a sua fuga, as mortes, as ameaças; chorássemos o seu desatino, a sua fuga; a incapacidade da sociedade de gerar equilíbrios. Tivéssemos chorado por termos sido incapazes de integrar, equilibrar, maturar uma existência. Nos livramos de “um homem-animal, graças a Deus”…. foi comemorada a caçada e a morte! “Quando você comemora a morte de alguém, o primeiro que morreu foi você mesmo”, diz Papa Francisco.
Vale lembrar que a pertença à humanidade, ser humano, o fazer-se humanado, pede pouco, como pouco pode levar à loucura.
Não há espetáculo no nascer, menos ainda no morrer, muito menos na morte matada. Na medida em que a morte vira espetáculo, a vida morre. E as mortes em Tabatinga; e as mortes no Abacaxis? Perdemos nossa humanidade e cresce a animalidade. O termômetro da nossa humanidade acusa estado: febril!
Leonardo Ulrich Steiner
Arcebispo de Manaus