O poema José, de Carlos Drummond de Andrade, diz da solidão e do abandono da pessoa, da desesperança e da sensação de que está perdido na vida, sem saber que caminho tomar. Um poema que nos faz encontrar tantos José com nome, mas sem paternidade. Tantos José que deixaram referências, nomes, portas abertas. O José com paternidade, os pais que se deixaram fazer pais.
Não se nasce pai! O pai vai nascendo, se constituindo, tornando identidade. “Fazer um filho” apenas indica que biologicamente tem uma descendência. Ser pai tem haver com cuidado, com geração. Gerar, estar presente para que o filho se gere. Manifestar a responsabilidade por aquele/a que gerou. É assim que gera em si mesmo a paternidade.
A lógica da paternidade é do dom de si mesmo, a generosidade de si para que os filhos cresçam e se responsabilizem por si mesmos. Assim, a paternidade não é um sacrifício, um estorvo, um cerceamento, mas dom. Dom: dar-se de si; é doação, entrega. Nessa dinâmica da paternidade, o pai percebe não ser mais o mesmo; é mais pessoa, cresceu em sua humanidade. O espaço para a frustração diminui, cresce a confiança e a alegria de participar da arte de viver.
Ser pai significa introduzir o filho, a filha no viver e conviver, na vida social. Despertar para a experiência da fé, o caminho da ética, a justiça, a liberdade, a honestidade. Torná-los capazes de opções, de sonhos, de partir em busca do futuro. Não segurá-los, nem prendê-los, nem subjugá-lo. Papa Francisco nos diz que “talvez seja por isso que a tradição, referindo-se a São José, ao lado do nome de pai colocou também o de «castíssimo». Não se trata duma indicação meramente afetiva, mas é a síntese duma atitude que exprime o contrário da posse. A castidade é a liberdade da posse em todos os campos da vida. Um amor só é verdadeiramente tal, quando é casto. O amor que quer possuir, acaba sempre por se tornar perigoso: prende, sufoca, torna infeliz. O próprio Deus amou o homem com amor casto, deixando-o livre inclusive de errar e opor-se a Ele. A lógica do amor é sempre uma lógica de liberdade, e José soube amar de maneira extraordinariamente livre. Nunca se colocou a si mesmo no centro; soube descentralizar-se, colocar Maria e Jesus no centro da sua vida.” (Patris corde)
Na sociedade atual, temos filhos órfãos de pai. Não conhecem o pai, não receberam o seu nome, perderam a referência, não contemplaram o rosto. Temos também, muitas vezes, filhos órfãos de pai: um pai ausente. Temos filhos órfãos de pais dominadores, autoritários, sem gesto de afeto, de proximidade. Necessitamos de pais com a autoridade do amor, da escuta, da palavra que anima, orienta e salva.
A presença paterna tem alta significância na vida de uma pessoa. Graças a Deus temos homens que assumem essa missão da paternidade para quem não se sintam na orfandade: avôs, tios, pais adotivos. São José exerceu a paternidade durante toda a sua vida! Jesus sentiu-se filho de José.
“Salve, guardião do Redentor e esposo da Virgem Maria! A vós, Deus confiou o seu Filho; em vós, Maria depositou a sua confiança; convosco, Cristo tornou-se homem. Ó Bem-aventurado José, mostrai-vos pai também para nós e guiai-nos no caminho da vida. Alcançai-nos graça, misericórdia e coragem, e defendei-nos de todo o mal. Amem.”
+ Leonardo Ulrich Steiner
Arcebispo de Manaus