Hoje, queria fazer uma homenagem aos leigos que participam da vida das nossas comunidades. Comunidades que só existem porque há pessoas que se empolgam com a vida em Cristo, que necessariamente implica vida comunitária. Vão um pouco contra a corrente do mundo que incentiva a concorrência entre as pessoas. Acreditam que a vida verdadeira é a que se vive em comum. Assim assumem os serviços da comunidade, sem medir esforços pessoais vivendo a sua vocação de leigo.
Na primeira Assembleia Geral da CNBB que eu participei, em 1999, o pregador do retiro foi Dom Celso José Pinto da Silva, já falecido, na época arcebispo de Teresina, Piauí. Ele começou dizendo o seguinte: Quando penso em quem está evangelizando no Brasil hoje, penso na Dona Maria, com seu jaleco de ministra da Eucaristia, indo levar a Eucaristia para os doentes do seu bairro. Uma vez por semana ela também visita o hospital e de vez em quando a cadeia pública. Dona Maria é viúva e cuidou da família sozinha. Dos filhos um lhe dá dor de cabeça porque envolvido com drogas. Mas ela tudo coloca nas mãos de Deus.
Foi mais ou menos assim a história que ele contou. Imediatamente vieram a minha lembrança estas mulheres abnegadas que fazem com que o amor do Senhor pelos pobres seja mantido nas nossas comunidades. São estas mulheres que sofrem pelos filhos, que colocam até a última gota de suor a serviço das comunidades. Ouvi estes dias, de uma catequista do interior, a triste história da sua colega que teve a filha estuprada pelo próprio pai, seu marido e, apesar de ter denunciado, deve viver na mesma comunidade que ele. Mas continua a celebrar por que segundo ela, só assim consegue forças para viver com dignidade.
São pessoas como estas duas mulheres que carregam o peso da vida da Igreja-comunidade. Nem todas as situações são dramáticas assim. Mas há também questões criadas pelos pastores. Quando muda um pároco é aquele sofrimento. O povo se liga emotivamente ao seu padre e segue as suas orientações pensando que são as orientações da Igreja. De repente vem o novo padre e muda tudo.
São os leigos que hoje celebramos, e sobretudo as leigas que vivendo a sua vocação no mundo real, evangelizam e são sal da terra e luz do mundo. Além das responsabilidades na Igreja tem as suas responsabilidades familiares. Tem que prover a própria família. Às vezes são responsáveis pelo dinheiro da comunidade e em casa não tem o mínimo necessário. Mesmo assim, são de confiança. As lideranças das comunidades são gente como todo mundo e a sua humanidade, como a de Jesus, às vezes pode escandalizar as comunidades.
Participar de uma comunidade, é algo que parece reservado aos pobres de espírito. São pessoas que sentem necessidade de caminhar junto com os outros e por isso não nos admiremos de ter gente com problemas na comunidade. Os sadios não precisam de médico diz Jesus. Pessoa que não tem problemas dificilmente vai participar de uma comunidade que lhe tiraria a autonomia. Leigos e leigas que carregam fardos na vida pessoal merecem todo o nosso respeito e apoio. Sintam-se hoje, mestres e doutores de uma vida com Jesus.
ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO EMÉRITO
JORNAL: EM TEMPO
Data de Publicação: 21 E 22.10.2020