É o tema da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos, promovida pelo Pontifício Conselho pela Unidade dos Cristãos e pelo Conselho Mundial das Igrejas Cristãs. No Brasil está sob a responsabilidade do CONIC – Conselho Nacional de Igrejas Cristãs. A semana vai iniciar na festa da Ascensão do Senhor até Pentecostes.
O tema quer lembrar Atos dos Apóstolos 28,2 que fala da recepção que as duzentas e setenta e seis pessoas tiveram na ilha de Malta depois do naufrágio sofrido pelo barco que levava Paulo à Roma. A bíblia do Peregrino diz que os nativos os trataram com uma inusitada amabilidade. A narrativa do naufrágio é o drama da humanidade em forma de história. Chegaram até o ponto de querer matar os prisioneiros para que nenhum fugisse. Paulo, no entanto, já tinha conquistado as boas graças do comandante, foi salvo por ele e assim todos os outros prisioneiros foram libertados. Marinheiros e soldados e demais passageiros participaram de uma refeição que Paulo fez com que tomassem antes de jogar no mar toda mercadoria. A narrativa tem lances cinematográficos.
Quando os organizadores escolheram o tema, não podiam prever que a humanidade estaria vivendo um drama semelhante quando a semana fosse celebrada no Brasil. Estamos todos juntos no mesmo barco da pandemia do coronavírus e temos a impressão de que vamos naufragar e ninguém tem noção onde vamos chegar. Estamos descobrindo da pior maneira possível o que o papa Francisco nos alertava profeticamente na Carta Encíclica Laudato Si’ para o perigo de a natureza querer fazer as contas com uma humanidade predadora. A encíclica está completando cinco anos.
Diante de um problema de tal gravidade nossas divisões se tornam ridículas. Graças a Deus temos também um movimento de solidariedade crescente. Como sempre a Cáritas, desta vez junto com a Pastoral do Povo de Rua, tomou a iniciativa de pedir ajuda para a população que é a mais abandonada. Depois apareceram outros grupos para ajudar as instituições de caridade, mas também os músicos e as centenas de pessoas que vivem do mundo do espetáculo. Mas mais importante será o fim, quando a pandemia estiver controlada. Seremos capazes de sentar ao menos uma vez juntos ao redor de uma mesa onde os mais fortes amem e sirvam os mais fracos?
Chegar à unidade não significa chegar à uniformidade, nem a dominação de uns sobre os outros. Só Deus sabe como será quando formos um. No momento histórico que vivemos se formos gentis para os outros, já teremos a partida ganha. E é tão bom quando somos surpreendidos por uma inusitada amabilidade. Longe de nós palavras depreciativas e atitudes que visam mais humilhar o outro que fazê-lo ver que a nossa verdade tem coerência, que a nossa maneira de viver é de acordo com o Evangelho. Que nos deixamos conduzir pelo espírito, e que para nós o serviço aos homens e mulheres de nosso tempo seja mais importante que a manutenção de estruturas de poder. E vamos rezar para que cheguemos à unidade. Se quiserem rezar conosco vamos rezar juntos, e se não quiserem, entenderemos. A unidade virá, ela já existe quando somos gentis, sobretudo quando não se espera gentileza.
ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO EMÉRITO DE MANAUS
JORNAL: EM TEMPO
Data de Publicação: 24.5.2020