Neste ano tenho o privilégio de completar quarenta anos de vida sacerdotal. Pude voltar à Igreja em que fui ordenado presbítero por Dom Benedito Ulhoa Vieira, na época Arcebispo de Uberaba. No dia 9 de dezembro de 1978, na Igreja de São João Batista, na Vila Mangalot, em São Paulo, onde havia vivido o período dos estudos de filosofia e teologia na Congregação do Espírito Santo, na presença de amigos e dos meus familiares pela imposição das mãos de um bispo assumi por toda a vida o ministério sacerdotal em prol do Povo de Deus que é a assembleia sacerdotal, profética e real.
Foi o início de uma grande aventura que, já no mês de janeiro do ano seguinte, me levou ao Paraguai numa missão do Movimento Boa Nova da Diocese da Caratinga, onde na companhia de dois senhores visitamos os colonos brasileiros naquele país. Pela primeira vez na vida entrei em contato com o trabalho escravo. Depois fui enviado ao Acre onde passei os anos mais bonitos e felizes de meu ministério. Aí me comprometi com a Amazônia por toda a vida. Durante seis anos fui membro do Conselho Geral de minha congregação, o que me fez ter uma visão da Igreja Universal a partir dos missionários espalhados pelo mundo. Passei ainda oito anos em São Paulo onde pude conviver com a população da rua, ao mesmo tempo que acompanhava jovens candidatos a vida missionária e a Pastoral da Juventude, o que para mim foi uma escola de cidadania.
Mas muito mais empolgante foram os encontros pessoais que se deram ao longo da jornada. Fiz muitos amigos, partilhei segredos, fui instrumento da misericórdia divina na vida de tanta gente. Mesmo não sendo um santo e tantas vezes mesclando no exercício do ministério e nas relações pessoais o desejo de poder, de prazer e de ter senão bens materiais, bens afetivos como a fama. Ao marcar a missa dos quarenta anos queria simplesmente agradecer a Deus por estar ainda vivo e pedir a graça de ser fiel até o final de meus dias. A celebração no entanto tomou rumos surpreendentes. A primeira impressão foi dada pela idade dos que vieram.
Um bom número das pessoas tinha participado da ordenação e alguns até tinham ido a minha cidade natal participar da primeira missa. Foi emocionante ouvir o significado que meu ministério teve na vida destas pessoas. Tive a mesma emoção quando celebrei os vinte anos de bispo em Manaus e Tefé neste ano. Creio que pude entender um pouquinho mais a minha vocação. O padre é a presença sacramental do Cristo no meio do povo e não só do povo católico.
Nos últimos tempos por nossa culpa, mas também por culpa daqueles que não podem aceitar que um homem fraco e pecador seja assumido por Jesus, a imagem dos padres católicos foi totalmente aviltada e eu pessoalmente sofri e sofro por causa disto. Mas cada vez que penso nos padres que fizeram parte da minha vida, e nestes dias tenho feito isto com mais frequência, encontro homens que viveram de forma heroica. Já tendo entrado no último tempo de minha vida, sou imensamente feliz por ser padre. É o que sempre quis ser e a única coisa que sei fazer bem. Ser padre e um bom padre. Isto basta para realizar um homem.
ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – Arcebispo Metropolitano de Manaus
JORNAL: EM TEMPO
Data de Publicação: 16.12.2018