Bons Pastores

Um dos momentos mais emocionantes da Assembleia Geral da CNBB é quando, em todos os anos, é feita na celebração eucarística a memória dos bispos falecidos desde a última reunião. Aí se percebe que a comunhão que existe no episcopado não é deste mundo, e transcende o espaço e o tempo e sendo de ordem sobrenatural só pode ser entendida na fé. Unidos pelo batismo, formando o Corpo do Senhor, aqueles homens foram ungidos no Espírito para o serviço sacerdotal e profético no governo do Povo de Deus. Uma união que a morte não separa, mas intensifica e reafirma a esperança que alimenta a fé e o amor. O presidente da celebração neste ano lembrou que a CNBB não é um sindicato, nem um clube, mas é a expressão mais alta da comunhão entre os pastores que dão a vida pelo rebanho cotidianamente. Depois de ordenado, o bispo não se pertence mais.

Neste ano dois dos bispos falecidos fizeram parte da minha história pessoal. Na minha ordenação em Tefé, vinte anos atrás, foram os dois bispos co-ordenantes, que a Igreja exige para a validade da ordenação. Naquele dia ao lado de Dom Mario Clemente, estavam Dom Agostinho Marochi e Dom Luiz Herbst. O primeiro, era o bispo de Presidente Prudente, minha diocese de origem, o segundo de Cruzeiro do Sul, lugar da minha primeira missão como sacerdote. Os dois morreram aos noventa e dois anos de idade, junto à Igreja que serviram como bispos. Duas personalidades distintas, se empenharam cada um ao seu modo na edificação do Templo do Senhor. Chegado o tempo da renúncia, a jurisdição retiraram-se da cena principal mas permaneceram em oração junto ao seu povo testemunhando valores que vão além da eficácia pastoral e da produtividade material.

Quando na procissão de entrada os seus sucessores traziam círios acesos lembrei-me da palavra de Jesus; o Bom Pastor dá a vida pelas ovelhas. É o mistério da cruz com o qual todos os homens e as mulheres tem que se confrontar. O sentido da nossa vida está na maneira como assumimos a nossa cruz. Dom Agostinho era um homem impulsivo, continuamente envolvido em polêmicas, sem nunca perder o entusiasmo e a paixão. Dom Luís por sua vez era um homem de conciliação que parecia pedir licença para exercer sua autoridade. Em comum tinham o senso de responsabilidade que os fazia trabalhar sem cessar. Mas creio que foi nos anos depois da renúncia que demonstraram a sua alma de pastores, ficando ao lado do rebanho, quais servos inúteis.

Foram durante longos anos membros da CNBB, como tantos outros bispos. Exerceram seu ministério sem alarde, na fidelidade aos compromissos assumidos. Hoje, dia do Bom Pastor, quero homenageá-los e dizer que eles fazem parte da nuvem de testemunhas que me acompanham e que sigo na esperança. Se antes eram exemplo, agora são intercessores. Fomos lembrados, no retiro deste ano, que a única autoridade que temos é aquela que vem da comunhão com Jesus que passa pela solidariedade com seus sofrimentos e com os do povo. Só será bom pastor aquele que acreditar em Jesus de Nazaré crucificado e ressuscitado, que continua sua obra de redenção na humanidade pelo mistério da encarnação.

 

DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS
JORNAL: AMAZONAS EM TEMPO
Data de Publicação: 22.04.2018

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