Não nos conformemos

As mulheres que tinham acompanhado Jesus desde a Galiléia observaram como o corpo de Jesus foi colocado no túmulo por José de Arimatéia. Naquele dia voltaram para casa e prepararam perfumes e bálsamos para os ritos fúnebres que não puderam ser feitos porque se iniciava o sábado. Mas logo que termina o sábado, no primeiro dia da semana, bem de madrugada, elas se dirigem ao túmulo. Nestes gestos, narrados por Lucas, encontramos a expressão de desejos profundos de quem não se conforma com a morte e que nos rituais a humaniza. Por isso, é importante vivê-los e se pode compreender o drama de quem não consegue realizá-los. Não nos conformamos com a morte.

Todos sentimos o drama do aniquilamento. Ao mesmo tempo corremos o risco de nos acostumarmos com ela e de banalizarmos o sofrimento e a dor que ela traz consigo. E quando assim o fazemos perdemos em dignidade. Cuidar dos mortos é sinal de humanidade e de valorização da vida. As mulheres que se dirigem ao túmulo de Jesus tornam-se as primeiras testemunhas da sua ressurreição. Inconformadas com a morte do Amado, tem a graça de experimentar em primeira mão a força da vida. A história, tanto a grande, a dos grandes acontecimentos, quanto a pequena, a da vida privada, escondida no dia a dia, são as pessoas inconformadas que a transformam e que fazem com que da morte brote a vida.

Mães que se recusam a perder seus filhos para violência gratuita, e que transformam a morte de entes queridos em bandeiras de luta, comunidades que se recusam a ver o ambiente destruído e lutam pela preservação e pelo desenvolvimento sustentável, professores, magistrados, médicos, funcionários públicos que não se conformam com o descaso e lutam por vida e dignidade em situações adversas. Policiais, agentes da lei, soldados que fazem de suas vidas, vidas doada para o bem comum. Políticos que recusam a corrupção e a busca insaciável do poder, comunicadores que dão a vida pela verdade. E a lista poderia continuar. São homens e mulheres que como as discípulas de Jesus, sem alarde, mas com muita perseverança e fé experimentam e testemunham a força da vida. De madrugada, no primeiro dia da semana, testemunham o evento que transformou a história: ele ressuscitou.

É pena quando a Páscoa se transforma na festa do coelhinho e dos ovos de chocolate, ou talvez de vinhos finos e comidas sofisticadas, e pior ainda, noite de muita farra e bebedeira. Será que temos medo da força da ressurreição, da ideia de uma vida que renasce, da possibilidade de redenção e salvação?  Será que temos medo da esperança, a virtude que leva ao amor, pois não permite que ele se perca e se esgote no presente tão fugaz e passageiro? Não tenhamos medo de preparar perfumes mesmo no meio do sofrimento e da dor. Não esqueçamos nossos mortos, e não nos conformemos nunca com a morte. Só aqueles que não se conformam, transformam e trazem alegria e esperança, porque mudam o mundo e fazem história. É tempo de Páscoa, tempo de ressurreição e de renovação. Jesus de Nazaré, o crucificado foi constituído Senhor e Messias, e todo aquele que nele crer encontrará a vida.

 

ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS
JORNAL: AMAZONAS EM TEMPO
Data de Publicação: 08.04.2018

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