Adoração

Recentemente a Arquidiocese de Manaus adquiriu uma casa para ser a casa do clero de Manaus. Sonho antigo, ela será uma casa de passagem para os padres do interior quando vêm à cidade, um lugar de repouso e recuperação para sacerdotes doentes e idosos que aí queiram morar. A casa é um antigo convento das Irmãs Franciscanas Missionarias de Maria que aí viveram por mais ou menos meio século. Foi construída para servir de moradia para as irmãs que trabalhavam no Hospital Alfredo da Matta. Ao entrar na casa pela primeira vez, além da beleza dos jardins, da disposição dos cômodos, impressionou-me a paz que reina no local. Demorei um pouco para entender a razão.

Nestes dias terminamos de arrumar a capela da casa e depois de celebrar a missa, guardamos o pão consagrado no sacrário, o mesmo das irmãs. Tomei consciência de que durante cinquenta anos as religiosas que gastavam a sua vida no serviços aos doentes ali passavam longas horas em adoração silenciosa. Uma energia positiva habita aquele lugar de encontro entre criatura e criador, de diálogos entre almas consagradas e o Senhor que as conquistara para o seu serviço. Ali no mistério eucarístico está o sinal maior do amor que se fez pão, alimento, para permanecer entre os seus. Aquele pequeno cômodo se transformou numa porta para a eternidade, um lugar de sonho. O mundo todo esteve presente nas intenções daquelas que eram antes de tudo missionárias. Com certeza também as mazelas da humanidade foram lembradas na intercessão daquelas madres, que viviam a maternidade no cuidado dos filhos de outras mães. Também ali se pediu perdão pelos pecados pessoais e pelos pecados do mundo. Na pequena capela cantaram-se os salmo e os hinos da liturgia das horas, como serviço de louvor em nome da Igreja.

Mas foi na adoração que se manifestou o amor que ultrapassa as fronteiras do espaço e do tempo. Fiz o propósito de fazer o melhor para que esta casa seja de fato uma casa sacerdotal, onde a presença de Deus seja sentida e percebida por quem nela habitar e por aqueles que vierem de passagem. Que ela seja o que todas as casas deveriam ser, lares, espaços de encontro com o mistério da vida, que se renova a cada nascimento e que mostra sua beleza no envelhecer sereno. Que os doentes que aí viverem sintam a solidariedade e o carinho de todos. Que a paz, procurada por todos seja encontrada a partir do sacrário e que daí se irradie com a força que brota da adoração. Adoração é uma forma de rezar que se dá no amor, que nada pede, nada agradece. É quando o orante faz a experiência da gratuidade que é uma dimensão essencial do amor. Não há mais necessidade de palavras. Perde-se a ansiedade dos discursos e a ansiedade de dar as razões de tudo e para todos. A adoração se alimenta da memória pessoal e coletiva, expressa nas Sagradas Escrituras que inspira o adorador e aponta para o futuro quando adoraremos todos o Cordeiro Imolado. Para adorar temos que ter a coragem de silenciar. É só no silêncio interior e exterior, que poderemos encontrar aquele que pode nos dar a Paz tão necessária na superação de toda violência.

 

ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS
JORNAL: AMAZONAS EM TEMPO
Data de Publicação: 11.3.2018

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