Há três anos faço parte daqueles que aparecem nas estatísticas como idosos. Convencionou-se que aos sessenta anos o indivíduo entra na terceira idade. A partir daí você tem uma série de privilégios, como viajar de graça nos ônibus urbanos, ter prioridade nas filas de banco, direito à vaga especial nos estacionamentos. No começo a gente não desfruta muito destas benesses, mas com o passar dos anos e o declinar das forças começamos a fazer questão de usufruir destes pequenos sinais de reconhecimento por parte de uma sociedade que exalta a cultura do corpo jovem e sarado. Aos poucos vamos reconhecendo que estamos velhos e usados. E a velhice se torna mais difícil quando vem acompanhada de diabetes, hipertensão e doenças degenerativas que apressam o envelhecimento.
O que é um processo natural pode virar culpa quando quem está ao teu lado insiste em dizer que se você tivesse feito isto ou aquilo não estaria nestas condições. Para os que podem começam as visitas aos médicos e todo mundo te dá conselhos, como se fosse possível evitar o entardecer da vida. Porque é disto que se trata. Na terceira idade o passado é muito maior que o futuro e os sonhos cedem cada vez mais o seu espaço para as lembranças. A gente percebe quando chateia os jovens com as nossas histórias as vezes repetidas inúmeras vezes, quando para eles o presente com suas sensações e prazeres é que importa. Mas como é bom ser velho e ter uma história para contar. Já conhecemos o segredo da vida, já vivemos traições e decepções, já semeamos muito, já amamos e fomos amados, já perdemos as ilusões.
Sonhamos agora o sonho dos outros, pois agora sabemos o que realmente é importante na vida. Aos trancos e barrancos nos tornamos sábios mesmo se muitos de nós sofrem amargurados porque sentem que não contam mais, não produzem mais e só dão despesa. E como é duro escutar quanto custamos e necessitar de cuidados quando passamos até pouco tempo cuidávamos dos outros e éramos provedores. Uma sociedade é humana na medida em que trata suas crianças e seus idosos. São os dois tempos de gratuidade da vida. No Brasil temos os Estatutos da Criança e do Adolescente e o do Idoso. Ambos foram elaborados com grande participação popular, mas ainda estão muito longe de serem implementados. Estamos nos tornando um pais de velhos. Isto é bom porque significa que a vida está sendo mais cuidada, mas exige de todos mudanças culturais profundas para não nos tornarmos um grupo de pessoas amarguradas.
Como as outras etapas da vida humana, a velhice tem suas ambigüidades. Que o Senhor nos dê sabedoria para vivermos felizes o ocaso da vida. Para quem acredita em Jesus e no seu sacrifício redentor este é o momento privilegiado de se identificar com ele para um dia poder dizer, já não sou mais eu quem vivo, mas é o Cristo que vive em mim. É uma graça e um privilégio poder envelhecer e completar o ciclo da vida, quando tantas vidas são ceifadas prematuramente e terminam de forma trágica. Tempo de liberdade e de gratidão, tempo de ser cuidado e sentir-se amado, não permitamos que a amargura e o ressentimento estraguem este tempo de graça.
ARTIGO DE DOM SERGIO EDUARDO CASTRIANI – ARCEBISPO METROPOLITANO DE MANAUS
JORNAL: AMAZONAS EM TEMPO
Data de Publicação: 1º.10.2017