A força da palavra

Setembro para a Igreja católica no Brasil é o mês da Bíblia. Já antes do Concílio Vaticano II, havia na Igreja um movimento bíblico, mas foi a partir dele que este movimento se expandiu e tomou força. No mundo católico multiplicaram-se as iniciativas para que todos pudessem ter acesso aos textos sagrados. Uma das experiências mais interessantes e eficazes foram os círculos bíblicos que procuravam ligar a bíblia com a vida. Na liturgia a mesa da Palavra retomou o seu lugar e em todas as celebrações sacramentais se passou a proclamar a Palavra. Foi um tempo bonito de se viver. Descobrir as Escrituras é descobrir a força da Palavra que vai além delas. Elas contêm a palavra e constituem para nós parâmetros de interpretação da Palavra.

A Igreja ao definir os livros canônicos, e ao considerá-los revelados deu segurança aos fiéis oferecendo critérios seguros de interpretação. É a Igreja que garante a verdade revelada. Ela vem antes das Escrituras. Por sua vez, ela também não é a causa de si mesma, mas é fruto da ação do Espírito que a precede. O Espírito que formou Jesus no seio de Maria fazendo com que o Verbo se fizesse carne e habitasse entre nós. Para os cristãos a Palavra é uma pessoa, ela é Jesus. Por isso conhecer as Escrituras é conhecer Jesus, pois nós as compreendemos à luz de Cristo, e compreendemos o Cristo a partir delas.

A palavra move a história. Ela constrói mas também destrói. O seu poder é tão grande que os que a dominam, adquirem um poder imenso. Os regimes totalitários muito antes de se imporem pelas armas se impuseram pelo discurso. Hoje a palavra é quase que monopólio dos meios de comunicação social. Facebook, Instagram, Whatsapp, é por onde circula a palavra. Para ser ouvido é preciso estar conectado. Mais que nunca o próprio meio determina a mensagem, seu formato, seu ritmo, seus tempos, sua verdade.

Neste mundo caótico a Palavra revelada é uma contra cultura, pois é eterna, tem pretensões de verdade absoluta, e não brota do sujeito mas é anterior a ele e é normativa. Por isso, mesmo a sua leitura e meditação nos libertam porque nos livram da tirania do imediato. Ela nos salva da mentira das aparências e da absolutização do efêmero. Sua meditação nos acalma e sacia a nossa sede de coisas belas e verdadeiras. Ela é uma boa notícia para os pobres porque se oferece a todos. Contemplar a sua ação no mundo permite relativizar os poderes que parecem não ter fim. Ela é uma força de resistência e de mudança que deixa os detentores do poder atônitos. A pergunta que fazem é sempre a mesma: De onde lhes vem tanta sabedoria?

Hoje começa a semana da pátria. Existe um patriotismo que é gerado e gera racismo, preconceitos, discriminação, violência e que usa argumentos falaciosos citando versículos bíblicos numa leitura fundamentalista da bíblia. Mas uma leitura séria dos textos sagrados dentro dos contextos em que surgiram e a contemplação da vida real liberta e conduz ao amor. Se Deus é Palavra e se Deus é Amor então a verdadeira palavra é o amor, quando cessam todas as palavras e a vida acontece.

 

ARTIGO DE D. SERGIO EDUARDO CASTRIANI – Arcebispo Metropolitano de Manaus
JORNAL:  AMAZONAS EM TEMPO
Data de Publicação: 03.09.2017

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